terça-feira, outubro 26, 2004

 

Desiludam-se amigos


Desiludam-se amigos, trotar mundos não é vida fácil. Veja-se o caso da semana que acaba de terminar: trabalhei setenta horas e não descobri legislação internacional de trabalho que me valesse; o disco do computador não gosta de latinos e apagou-me os ficheiros todos; a máquina de chocolates achou-me forasteiro e ficou-me com as moedas sem me dar o chocolate; a máquina de lavar a roupa achou-se grávida e decidiu largar águas estéricas quando me tratava da vestimenta; o cesto da roupa ficou com medo de ser o pai e pirou-se escadas abaixo quando eu carregava peúgas lavadas edifício acima; fui-me abaixo no ginásio exactamente no preciso momento em que a suiça mais gira ía a passar; houve qualquer coisa que se notou ao de cima quando estive apertado contra ela num autocarro apinhado em hora de ponta; o senhor pica achou-me com cara de quem já tinha saudade de largar doze notas; a senhora secretária achou-me com cara de encarregado de mudanças; a máquina voltou a não me dar o chocolate quando pus mais moedas; ouvi uma descompostura do chefe num incompreensível alemão; entornei o café sobre o meu fato italiano; entornei o almoço francês sobre o fato dum dos directores contra quem choquei no refeitório; descobri que a pessoa a quem perguntei se me vinha arranjar o computador era o chefe do chefe do meu chefe; baralhei-me ao falar estrangeiro e disse numa reunião que os motoristas tinham de be good looking em vez de look good; aluguei um DVD americano que não funciona no meu leitor europeu; cortei uma unha com uma tesoura made in China e agora tenho o dedo inchado; perdi os meus dois melhores amigos na lotaria do amor e tive de curar a mágoa com vinho suiço carrascão!

Mas o pior mesmo, aquilo que foi mesmo mesmo mau, foi ter escorregado num cagalhão!


Comments:
"Águas estéricas"? Será isto algum jargão médico que desconheço? Ou antes a ortografia incorrecta da palavra "histérica"? Já não basta os posts aparecerem só quando o rei faz anos, agora ainda juntam linguagem hermética!!! Enfim, mas devo concordar que o pior de tudo é mesmo escorregar num cagalhão...
 
Nem incorrecção nem jargão, que os estes marinheiros, embora sós, não são adversos à boa comunicação, nem entretêm o tempo solitário a brincar aos médicos. Tão pouco para os anos do rei o tempo dá!
Para além da grafia alternativa, "estérica" assume um significado diferente de "histérica", numa relação semelhante à existente entre "estória" e "história". Nos seus sentidos mais correntes, "história" é uma "narração ordenada, escrita dos acontecimentos e actividades humanas ocorridas no passado", enquanto que "estória" se definie como "narrativa de lendas, contos tradicionais de ficção".
Não me parece que alguém possa afirmar ter visto no "passado" uma máquina de lavar grávida dum cesto de roupa, ou considerar isso uma situação "ordenada" ou procedente de "actividades humanas". Visto está que nunca tal personagem poderia ser "histérica". Muito mais fácil será imaginá-la em "lendas" ou "contos tradicionais de ficção", comportando-se de forma "estérica".
Bem sei que o vocábulo não é ainda considerado pelos dicionários da Língua Portuguesa, o que indicia o atraso tecnológico do nosso país no capítulo da "electrodomesticação", ou as dificuldades logísticas sofridas pela Academia das Ciências na actualização do seu volumoso dicionário. Tanto eu como o Chico somos alheios a qualquer um destes factores, mas ficamos agradecidos pelo reparo do amigo Anónimo, que nos sensibilizou para a necessidade de explanar de forma mais detalhada esta lacuna linguística.
 
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